14/12/2020 / Escola Miró, Fundamental 2
Registros Reflexivos – importante estratégia para formação de professores
Escrito por Codi e Marina – Coordenadoras Pedagógicas do Fundamental 2
Era novembro do ano mais difícil que a equipe de professores já teve profissionalmente. A pandemia chegou para, entre muitas outras coisas, nos arrancar certezas e testar nossa capacidade de desaprender.
Como Coordenadora, pedi para que cada professor escrevesse um Relatório Final do seu trabalho neste ano, para que enviássemos às famílias junto com o boletim de cada aluno. Sugeri que falassem dos conteúdos trabalhados, dos projetos realizados e da revisão curricular que tivemos que fazer para nos adaptar ao modelo remoto e híbrido de ensino.
Mas eu pedi também que os professores escrevessem sobre eles próprios. Que falassem das próprias dificuldades e realizações; das expectativas que tinham, do que foi surpreendente e do que foi frustrante. Que se colocassem, sem medo, como sujeitos que também sofreram as consequências do ano pandêmico. Que precisaram de muitos erros para cada acerto, se arriscaram e se reinventaram enquanto as aulas aconteciam, os alunos demandavam e a infinidade de recursos tecnológicos quase os engoliam.
Esse tipo de escrita, reflexiva e autobiográfica, tem um importante papel na formação do professor. Em um primeiro aspecto, porque é fundamental que o professor reflita, o tempo todo, sobre suas intenções e estratégias. No construtivismo o ofício do professor se diferencia de um saber técnico imutável. Para que seja potente a aprendizagem dos alunos, o docente deve refletir e ajustar suas ações. Na perspectiva da construção do conhecimento (diferente da transmissão) torna-se imprescindível que a prática docente seja reflexiva.
“Não se escreve sobre a experiência, mas sim a partir dela. O mundo não é somente algo sobre o que falamos, mas algo a partir do qual falamos. É a partir daí, a partir do nosso se-no-mundo, que temos algo para dizer, algo para contar, algo para escrever. Além disso, as palavras não apenas representam o mundo, mas também o abrem, não apenas uma ferramenta, mas também um caminho ou uma força. Ou ainda de outro modo, a linguagem como tato mais fino” (CONTRERAS, 2018, p.23)
Portanto, sugeri que esses registros reflexivos pudessem descrever aspectos de nossos propósitos educacionais. Que explicassem os objetivos de cada área. Mas, principalmente que a escrita fosse capaz de também nos transformar um pouco e falar de nossas angústias. Uma palavra que pudesse ser capaz de não-dizer.
“Uma educação poética é uma educação que sabe que o ser humano está de passagem no mundo, que somos convidados na vida. Uma educação política é uma educação que sabe que a palavra humana é plural e que esta palavra, ou palavras, tem sentido não somente pelo que dizem, pelo que podem dizer, mas também e essencialmente, pelo indizível, pelo silêncio, pelo testemunho, pela alteridade, pela ausência. E também pela fragilidade e vulnerabilidade, pela mestiçagem e a fronteira, pelo desaparecimento de pontos de referência estáveis e absolutos.” (MÈLICH, 2011 p.275)
Referências bibliográficas
CONTRERAS, J. A experiência, o mundo e o ofício. In: Esperando não se sabe o quê: sobre o ofício do professor. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2018.
MÈLICH, J. A palavra múltipla: por uma educação (po)ética. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011.